sábado, 4 de abril de 2015

Enologia: um diploma para ser degustado.....

Se você acha que o caminho para a formação de um enólogo se resume a passeios por parreirais e agradáveis degustações, está hectares longe de acertar. Com noções que vão da química ao desenvolvimento rural, do marketing ao manejo de solo, os cursos de graduação em Enologia ainda são poucos e recentes, mas o mercado de trabalho reserva boas oportunidades aos profissionais. No Rio Grande do Sul, apenas quatro instituições oferecem o grau superior, que, de acordo com a lei vigente, é exigência para buscar o título de enólogo — quem pode assumir, dentre outras atribuições, a responsabilidade técnica por uma vinícola.
Serra e Campanha têm cursos pioneiros em Enologia
Presidente da Associação Brasileira de Enologia, Juliano Perin diz que a principal atividade do enólogo segue sendo a elaboração de vinhos e espumantes, mas ressalta que, com um mercado dinâmico, que apresenta novas oportunidades e impõe desafios, a área de atuação tende a se expandir.
— Se tomarmos como exemplo o profissional de 20 anos atrás, tínhamos um perfil mais voltado para o interior da vinícola. Nos dias atuais, o enólogo, além de se ocupar com a produção do vinho, tem de estar atento às novas tecnologias, às demandas do consumidor, ao estilo de vinho, além de trabalhar na comunicação dos produtos feitos pela vinícola — afirma.
No Rio Grande do Sul, a Serra, a Região Sul e a Campanha são os caminhos para quem quer se profissionalizar na área. O enólogo pode atuar como protagonista ou em parceria, em vinícolas, cursos de degustação ou, então, juntar um pouco de tudo e viajar pelo mundo. Essa última ideia foi a inspiração de Maria Amélia Duarte Flores, 35 anos, enóloga formada em 2000.
— Não bebo tanto vinho, mas sou louca com a paisagem, com quem trabalha, com a história dos lugares — conta.
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Neta de cantineiro de Garibaldi, Maria Amélia começou jovem a se dedicar aos estudos da enologia e da viticultura, inicialmente em um curso técnico. Logo viu que não se identificava com a lida de dentro da vinícola.
— Quem busca a área técnica tem de ser uma pessoa bem milimétrica, de muita rotina, e eu não tenho esse perfil. Gosto de me comunicar, de explicar para as pessoas de onde vem o vinho — diz.
Maria Amélia fez Enologia em Bento Gonçalves e hoje é dona da loja Vinho & Arte, na Capital, escreve sobre vinhos, oferece cursos de degustação, dá consultorias a vinícolas e sugere o que elas devem comunicar ao cliente:
— O mercado está obrigando a vinícola a pensar em comunicação. Se você quer fidelizar um mercado, tem de dar explicações ao cliente.
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Se Maria Amélia ainda não alcançou o sonho de viajar o mundo, está trabalhando para isso. Já visitou cerca de 500 vinícolas em países como França, Argentina, Brasil, Portugal e Itália. Ela ressalta que a ciência da bebida envolve gastronomia, história, geografia e muito de relações humanas:
— O vinho é resultado da vivência do homem. Se você fala com um produtor da Toscana, na Itália, ele tem uma forma de pensar e de agir totalmente diferente do de Cape Town, na África do Sul.
Caminhos do curso
No Rio Grande do Sul, há quatro instituições que oferecem cursos de Ensino Superior em Enologia
- Dom Pedrito: bacharelado em Enologia pela Universidade Federal do Pampa - Unipampa
-Bento Gonçalves: tecnólogo em Viticultura e Enologia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul - IFRS
-Pelotas: dois tecnólogos em Viticultura e Enologia, pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense - IFSul
Alguns campos de atuação do profissional:
- Estabelecimentos vitícolas e enológicos
- Instituições de pesquisas científicas e tecnológicas, como colaborador e como professor de disciplinas de sua área de formação
- Laboratórios de fiscalização de vinhos e derivados
- Estabelecimentos de comercialização de vinhos e derivados
- Departamento de controle de qualidade
- Estabelecimentos de produção e comercialização de produtos enológicos
- Laboratórios de análises físico-químicas e microbiológicas do vinho e derivados

Serra e Campanha têm cursos pioneiros em Enologia....

No quinto semestre de Enologia e Viticultura do Instituto Federal Rio Grande do Sul (IFRS), em Bento Gonçalves, Lucas Foppa Alves, 19 anos, está convicto de que "quando se entra no mundo do vinho, é difícil voltar".
— É uma área muito apaixonante — diz. — A grande satisfação do enólogo é, depois de anos se dedicando àquele produto, ver o resultado final. É um retorno pessoal, até.
Enologia: um diploma para ser degustado O jovem já teve experiência na parte técnica de vinícolas e hoje trabalha na área de turismo — realiza as visitações da vinícola Chandon, em Garibaldi. Diferentemente de muitos dos jovens de Garibaldi que optam pela formação, não teve um "empurrãozinho" de casa. Elegeu o curso por escolha própria e sem ter ligação com alguma vinícola. Primeiro, ingressou no curso técnico. Gostou, e logo partiu para o Superior.
Luciano Manfroi, diretor-geral do campus de Bento Gonçalves do IFRS, primeira instituição a ter Ensino Superior em Enologia no país, explica que, enquanto no curso técnico o estudante adquire conhecimentos básicos para atuar na profissão, o Ensino Superior dá o conhecimento científico para entender a atividade.
Manfroi conta que, no tecnólogo da instituição, os alunos têm noções de planejamento, administração, química, biologia e economia. Isso além das atividades práticas de viticultura, com aulas de preparo do solo, mecanização, manejo da videira, poda, adubação, colheita e enologia — que abrange desde da vinificação, moagem e prensagem ao engarrafamento.
Ele garante que é alta a empregabilidade de profissionais formados no setor. Ainda mais por se tratar do Vale dos Vinhedos, na Serra Gaúcha.
— O Estado tem mais de 700 vinícolas, e estamos no coração da região produtora. Aqui, o pessoal está inserido — diz.
Na região da Campanha, especificamente em Dom Pedrito, em agosto vai se formar a primeira turma de Enologia da Unipampa. A coordenadora Renata Zocche conta que é o primeiro curso de bacharelado na área no Brasil — além de ter uma duração maior, ela afirma que o objetivo do formato é maior aprofundamento.
O enólogo Marcos Gabbardo, professor adjunto da Unipampa, conta que, historicamente, a região despertou interesse dos principais produtores de vinho do Rio Grande do Sul: em função de suas condições de clima e relevo, desde a década de 1970 investimentos são feitos na região.
— O curso vem para formar profissionais para atuarem na região e no restante do Brasil, além de gerar conhecimento disponível para a atuação da indústria enológica na Campanha — ressalta.